Transtorno bipolar: a dor reprimida por trás dos altos e baixos
Quando alguém muda de humor, logo dizem: “deve ser bipolar”. Mas será que é isso mesmo? Neste texto, você vai entender — por meio de uma história — o que é, de fato, o transtorno bipolar, o papel defensivo da mania e como a psicanálise pode ajudar a acessar a dor que foi reprimida.
Paloma O. Anaya
8/5/20252 min read


Transtorno bipolar: a dor reprimida por trás dos altos e baixo
Você sente que vive entre extremos — entre momentos em que tudo parece possível e outros em que nada faz sentido — talvez seu sofrimento esteja tentando dizer algo. A análise pode ser esse lugar de escuta e cuidado
"Quando a euforia é uma forma de fugir da dor"
Lucas era visto como o mais animado do grupo. Falava rápido, não parava quieto, surgia com ideias grandiosas, gastava sem pensar e dormia muito pouco. Dizia que estava “no auge da criatividade”. Mas, de repente, sumia. Passava dias trancado no quarto, sem energia para sair da cama, se sentindo um peso no mundo.
Esse ciclo repetitivo entre euforia e colapso não era “jeito dele”. Era transtorno bipolar — uma estrutura que revela uma oscilação psíquica profunda. E que, na escuta psicanalítica, não se reduz à biologia nem à ideia de “instabilidade emocional”.
Na psicanálise, entendemos que a mania é uma forma de defesa. Ela surge como compensação de conteúdos psíquicos reprimidos. Quando o sujeito entra em contato com perdas, angústias, faltas que não consegue simbolizar, pode surgir um funcionamento maníaco: ele se afasta da dor indo ao extremo oposto — acelerando, agindo, produzindo.
Mas por trás da fala excessiva, da energia inflada e da autoconfiança exagerada, está aquilo que o sujeito não quer ou não consegue encarar. E é justamente olhando para o que está sendo evitado que começamos a compreender o quadro.
A mania não é alegria. É uma negação da dor. É uma tentativa do psiquismo de não entrar em contato com a falta, com o vazio, com a depressão que ameaça emergir.
Durante o episódio maníaco, ocorre um colapso entre o Ego e o Superego. O Superego — que normalmente representa os limites, as proibições, a voz crítica — se funde ao Ego. O sujeito se sente perfeito, completo, sem falhas. E, sem o Superego para mediar, o Ego fica à mercê dos impulsos do Id, entregando-se a comportamentos impulsivos e sem censura.
Só que esse estado é insustentável. Quando Ego e Superego voltam a se separar, o Superego retorna mais cruel, mais punitivo, mais castrador. É aí que vem o mergulho na depressão: culpa, desvalia, sensação de fracasso e, muitas vezes, pensamentos suicidas.
E assim se forma um ciclo:
O Superego castiga → o Ego não suporta → entra em defesa maníaca → Superego se ausenta → depois retorna pior.
Tipos de transtorno bipolar:
A clínica diferencia dois principais tipos:
🔹 Tipo I: episódios maníacos intensos, com comportamento expansivo, grandiosidade, pouca necessidade de sono, fuga de ideias, impulsividade, fala acelerada e prejuízos reais nas relações e na vida cotidiana. É comum haver, depois, episódios depressivos graves.
🔹 Tipo II: episódios hipomaníacos (versão atenuada da mania, sem prejuízos marcantes), mas com depressões profundas e recorrentes. O sofrimento costuma ser grande, embora o polo hipomaníaco passe, às vezes, despercebido.
A mania muitas vezes funciona como negação da realidade psíquica. O sujeito precisa evitar a perda, o luto, o sentimento de falta. Mas o que não é elaborado, retorna com mais força. E quanto mais negamos a dor, mais aprisionados ficamos nela.
A psicanálise oferece um espaço onde essa dor pode ser escutada e simbolizada. Onde a fala encontra um lugar de elaboração, e o sujeito pode começar a sair do ciclo que o adoece — não apagando os afetos, mas dando a eles forma e sentido.
